sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Carta para a tua melhor amiga ou teu melhor amigo

Hey, você ai.. 
Sim, você que está lendo, tenha certeza de que é para ti.


Sabe, faz tanto tempo que não te vejo, e isso me angustia um pouco, mas sempre, sempre mesmo você se preocupa comigo a ponto de dizer que ainda está vivo, por deixar rastros. (Isso é bem legal da sua parte)

Ainda que tudo desmorone um dia, tudo vá de encontro a pior das hipóteses, eu prometo tentar estar ao seu lado, nem que seja por frações de segundo. Ok, o drama aqui foi longe demais; mas é bem isso mesmo, eu faria bastante coisa para ter você por perto, e não duvide disso..

É tão banal isso tudo e, ao mesmo tempo, tão pequeno, realmente palavras não são nada. 
Eu sei que, de verdade, você não vai evaporar, mas.. então por que, por que eu ainda pressinto isso?

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Carta para a tua paixão

Serei breve em minhas palavras, pelo simples fato de que já sabes o que sinto por ti.
És mais que uma paixão para mim, és meu amor, e por você sei que posso tirar os pés do chão e flutuar.
Nunca me abandone, pois eu jamais te deixaria sozinho.


Conte comigo, como se conta com um amigo e esteja ao meu lado pelo maior tempo possível.. eu não aguento a solidão. 

Fique bem.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

What you want

Aceite o fato de que nem sempre tudo tenderá a ser como queres, 
mas exija que sua mente não desista de tudo que fazes questão de realizar.
 A vida é sinônimo de luta.

Impacto em constante mudanças

     A mudança nos torna consequentemente aptos para nossas escolhas. Alguns chamam isto de fé, outros, mais ainda, julgam que mudanças são aquelas que, aos olhares de outros, ficam explícitas (o famoso "de dentro para fora"). O moinho que nos move são as constantes mudanças, sejam elas boas ou ruins, mas são o que são e, nesse meio tempo, o rompimento dos padrões já flui em nossas vidas e não mais nos poemas de Drummond.
    Parte do que não era, passa a ser; somos dotados de pensamento e sabemos bem o que desejamos, é inútil dizer que o Sol brulha mais que a purpurina em seus olhos, a diferença não está na intensidade do brilho e, sim, na forma como é demonstrado isso. Certamente, o brilho solar é bem mais natural comparado ao glitter, mas não o torna fosco. Gradativamente a mídia e os meios de comunicação estão movendo e rompendo firmemente com esses padrões de pensamento, uma vez que a capacidade humana é o robô da TV e acaba sendo o rato na armadilha mais bem sucedida dos últimos tempos: a modernidade. Da mesma forma que um violão afina suas cordas, nós somos moldados para sermos de um só aspecto, a perfeição. 
    A criação da imagem perfeita torna-se assim devido ao brilho dos olhos, a cegueira da luz, o tato usado para admirar o muro que não é quebrado enquanto tivermos a porcaria do tabu, até porque esse procedimento idealizador um dia será a nossa cadeira de rodas, se já não for. Não dá para descrever a raça humana, são diversas desigualdades, milhões de cabeças e muito poucos para reiná-la. Ainda há razão quando digo que um leão pequeno deve compensar com um rugido grande.

sábado, 24 de setembro de 2011

FUCK THE SYSTEM

É nostalgia atrás de nostalgia.
Vingança atrás de quem o vinga.
Tudo nessa vida possui causas e consequências.
E de fato, somos apenas um número nessa porra.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Cheiro do Ralo

O Cheiro que agora inalo me traz lembranças.
Aquelas do shampoo 3 em 1 de cor verde usado pelo meu pai, além do cheiro da maconha que sempre estava impregnado em seu ser. Era diferente com minha mãe que sempre arrotava cerveja, com peitos caídos, tinha os cabelos em formato de leão e fedia a cigarro. Conseguia sentir também o cheiro de queijo e vinho seco do meu tio, nos fins de domingo, e da minha tia de libertação. Os mais velhos tem cheiro de podre, como se vivessem a espera da decomposição. Tudo ronda com cheiro de algo, cheiro de tudo mas cheio de nada, lotado de desprezo.



E, mesmo que aquele monstro, em vão, tentasse romper a existência da flor para tentar esconder o que também sente, ela não deixaria que o sentimento, há muito tempo guardado, fosse para a lata de lixo.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O barulho do Mundo

Você ouve música, e muda a estação, desliga, enrola os fios, se acomoda, tenta ler um pouco, tudo balança e se move, até seu dedo mindinho, você pede licença, você dá licença, uma idiota senta ao seu lado, você finge não ver, uma baleia encalha bem no banco carona e abre uma barra de chocolate Nestlé e você ri, você ouve um funk ao longe, você vê de tudo nas ruas, e pior do que a música ambiente são os velhos que olham descaradamente o rabo imenso das belas jovens que andam sem parar, conversando no celular ou apenas trazendo consigo suas enormes bolsas que cabem uma casa, você se depara com o nada, apenas a janela ali, então se encosta e percebe que o mundo não pára, a vida muito menos.
 A minha rotina é doar 3 horas de minha gentileza para os passageiros de um ônibus.

domingo, 18 de setembro de 2011

Obrigada (por ter se mandado)

Quando você olhar bem dentro dos meus olhos..
você verá a antiga menina que sorria sempre para ti.

Quando você olhar bem dentro dos meus olhos..
sentirá minha presença, verá meu brilho, tocará em minha pele e nunca mais me deixará sozinha.

Quando você olhar bem dentro dos meus olhos..
perceberá que sou eu a pessoa que tanto procurou e, por mais que seja idiota, eu direi "não".

Quando você olhar bem dentro dos meus olhos..
verá o tamanho da minha negação por tudo que havia dito e notará minhas mentiras.

Quando você olhar bem dentro dos meus olhos..
alcançará meu âmago, sacrificará toda a minha carne e me libertará desse caminho de eternos arames farpados.
Por si só, a menina andava descalça, tentando desviar de todos os arames que apareciam por ali. O barro, a terra molhada da chuva da noite passada. Tudo ia a favor para um encontro. Ela se sentia só. Obrigada por ter se mandado, ter me condenado a tanta liberdade. Pelas tardes, nunca foi tão tarde. Teus abraços, tuas ameaças.

Análise I

O tempo não pára - Cazuza


"Disparo contra o Sol

sou forte, sou por acaso
minha metralhadora cheia de mágoas" 

Por mais que Cazuza estivesse em uma fase ruim, demonstra de início sua força mediante a tudo que passou na vida.


"Eu sou um cara
cansado de correr na direção contrária
sem pódio de chegada ou beijo de namorada
Eu sou mais um cara"



O cansaço, a ausência de amores, o fracasso, tudo tendia  favor da desistência

"Mas se você achar
Que eu tô derrotado

Saiba que ainda estão rolando os dados
Porque o tempo, o tempo não pára"

A partir do que é dito, o ouvinte percebe que ele consegue inverter esse papel e lutar por algo que ainda está por vir (os dados ainda estão rolando)

"Dias sim, dias não
eu vou sobrevivendo sem um arranhão
da caridade de quem me detesta"

Cazuza satiriza todos aqueles que um dia já o quiseram mal e que, por algum motivo, não obtiveram êxito

"A tua piscina tá cheia de ratos

tuas ideias não correspondem aos fatos
O tempo não pára"

Ele, por meio de metáforas, afirma que aqueles que o querem mal, são impostores e que estes não estão lúcidos, falam muito e nunca tem o que dizer

"Eu vejo o futuro repetir o passado
eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára"
Pelo que entendi, nessa parte ele anseia por melhorias, não só sobre o caso que leva a sua morte, mas também por esse mundo que o cerca.

"Eu não tenho data pra comemorar, às vezes os meus dias são de par em par
procurando agulha num palheiro"

Quem conheceu a vida de Cazuza, sabe bem sobre suas farras e seus amores expressos, e é disso mesmo que ele fala. A cada bebida, uma nova procura.

"Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos brasileiros"
Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro

transformam um país inteiro num puteiro
pois assim se ganha mais dinheiro"

Mais do que um tapa na cara do país 


LONGE É UM LUGAR QUE NÃO EXISTE
Richard Bach

“— Rae! Obrigado por me convidar para a sua festa de aniversário!”Sua casa fica a mil quilômetros da minha e viajo apenas pela melhor das razões. E uma festa para Rae é a melhor e estou ansioso para estar ao seu lado. Começo a viagem no coração do Beija-Flor, que há tanto tempo você e eu conhecemos. Ele se mostrou amigo como sempre, mas ficou espantado quando lhe disse que a pequena Rae estava crescendo e que eu estava indo à sua festa de aniversário, levando um presente. 
Voamos algum tempo em silêncio, até que finalmente ele disse:
— Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é o fato de estar indo a uma festa.
— Claro que estou indo à festa. — respondi. — O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Ele ficou calado e só voltou a falar quando chegamos à casa da coruja:
— Podem os quilômetros separar-nos realmente dos amigos? Se quer
estar com Rae, já não está lá?
— A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário
com um presente. — falei para a coruja. Parecia estranho dizer "indo" depois da
conversa com Beija-Flor, mas falei assim mesmo para que Coruja compreendesse.
Ela voou em silêncio pôr um longo tempo.
Era um silêncio amistoso, mas Coruja disse ao me deixar em segurança na
casa da águia:
— Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é
ter chamado sua amiga de pequena.
— Claro que ela é pequena, porque não é crescida — respondi. — O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Coruja fitou-me com os olhos profundos, cor de âmbar, sorriu e disse:
— Pense a respeito.
— A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário
com um presente. — falei para Águia. Parecia estranho falar agora "indo" e "pequena", depois das conversas com Beija-Flor e Coruja, mas falei assim mesmo para que Águia compreendesse.Voamos juntos sobre as montanhas, subindo nos ventos das montanhas.
E Águia finalmente disse:
— Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é
essa palavra aniversário.
— Claro que é aniversário. — respondi. — Vamos comemorar a hora que Rae começou e antes da qual ela não era. O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Águia curvou as asas para a descida e foi pousar suavemente sobre a areia
do deserto.
— Um tempo antes de Rae começar? Não acha que é mais a vida de Rae que começou antes que o tempo existisse?
— A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. — falei para Gavião. Parecia estranho falar "indo", "pequena" e "aniversário", depois das conversas com Beija-Flor, Coruja e Águia, mas falei assim mesmo para que Gavião compreendesse.
O deserto se estendia interminavelmente lá embaixo e ele finalmente disse:
— Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é
crescendo.
— Claro que ela está crescendo — respondi. — Rae está mais perto de ser
adulta, mais longe de ser criança. O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Gavião pousou finalmente numa praia deserta.
— Mais um ano longe de ser criança? Isso não me parece ser o mesmo
que crescer.
E Gavião alçou vôo e foi embora.
Eu conhecia o bom senso de Gaivota. Voamos juntos, pensei com muito cuidado e escolhi as palavras, a fim de que, ao falar, Gaivota soubesse que eu estava aprendendo:
— Gaivota, por que está me levando a voar para ver Rae, quando na verdade sabe que estou com ela?
Gaivota sobrevoou o mar, as colinas, as ruas, pousou suavemente em seu telhado e disse:
— Porque o importante é você saber a verdade. Até saber, até realmente compreender, só pode demonstrá-la em coisas menores, com ajuda externa, de máquinas e pessoas e pássaros. Mas deve se lembrar sempre que não saber não impede a verdade de ser verdadeira.
E Gaivota se foi.
E agora é chegado o momento de abrir o seu presente. Presentes de lata e
vidro amassam e quebram num dia, somem para sempre. Mas eu tenho um presente melhor para você.
É um anel para você usar. Cintila com uma luz especial e não pode ser
tirado pôr ninguém, não pode ser destruído. Somente você, no mundo inteiro, pode
ver o anel que lhe dou hoje, como fui o único que pude vê-lo quando era meu.
O anel lhe dá um novo poder. Usando-o, você pode alçar vôo nas asas de
todos os pássaros que voam.
Pode ver através dos olhos dourados deles, pode tocar o vento que passa pôr
suas penas macias, pode conhecer a alegria de se elevar muito acima do mundo e
suas preocupações. Pode permanecer no céu pôr tanto tempo quanto quiser,
através da noite, pelo descer do sol; e quando sentir vontade de outra vez descer,
suas perguntas terão respostas, suas preocupações terão acabado.
Como tudo o que não pode ser tocado com a mão nem visto com o olho, seu
presente se torna mais forte à medida que o usa.
A princípio, pode usá-lo apenas quando está fora de casa, contemplando o
pássaro com quem você voa.
Mais tarde, porém, se usá-lo bem, vai funcionar com pássaros que não pode
ver, até que finalmente acabará descobrindo que não precisa do anel nem de
pássaro para voar sozinho acima da quietude das nuvens.
E quando esse dia chegar, deve dar seu presente a alguém que saiba que irá usá-lo
bem, alguém que possa aprender que as coisas que importam são as feitas de
verdade e alegria, não as de lata e vidro.
Rae, este é o último dia especial de comemoração a cada ano que estarei
com você, tendo aprendido com os nossos amigos, os pássaros.
Não posso ir ao seu encontro porque já estou com você.
Você não é pequena porque já é crescida, brincando entre suas vidas como
todos fazemos, pelo prazer de viver.
Você não tem aniversário porque sempre viveu; nunca jamais haverá de
morrer. Não é a filha das pessoas a quem chama de mãe e pai, mas a companheira
de aventuras delas na jornada maravilhosa para compreender as coisas que são.
Cada presente de um amigo é um desejo de felicidade.
É o caso do anel.
Voe livre e feliz além de aniversários e através do sempre.
Haveremos de nos encontrar outra vez, sempre que desejarmos, no meio da
única comemoração que não pode jamais terminar.

Metamorfo

Já não sou tão astuta como era.. 
meus pêlos estão caindo 
e meu sorriso vai junto.
Tudo que você vê 

são cascas de feridas que surgem..

[no meu corpo] 
A raposa está dando adeus.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Knock, Knock


(retirado do Blog "Os Monstros Invisíveis")

Tudo que eu preciso é lembrar algumas das piadas favoritas do meu velho e fazer ele se fartar de rir até se curar.
Eu penso, que mal pode fazer?
Então esse adulto entra sorrateiramente no quarto do seu pai no asilo, puxa uma cadeira pro lado da cama e senta lá.
O filho olha para a cara pálida de seu pai morimbundo e diz “Então essa loira entra num bar num bairro onde ela nunca tinha ido e ela tem uns peitões e um rabo apertadinho, então ela pede ao garçom uma cerveja, e ele serve uma cerveja a ela, tirando que o garçom batiza a garrafa e a loira fica inconsciente, e todos os caras no se inclinam sobre a mesa dela, levantando sua saia e fodem ela, e na hora de fechar eles dão tapinhas pra acordar ela e dizem que ela tem de ir embora. E essa garota uns poucos dias depois volta com seus peitos, seu rabo, e ela entra, e pede uma cerveja, eles batizam a bebida, e ela é fodida pela multidão até que um dia ela entra e pede ao garçom se poderia dar uma vodka ao invés da cerveja. Feito.
Eu não contava esta piada suja em particular desde a primeira série.
Mas meu pai, ele costumava amar essa próxima parte.
O garçom, o garçom sorri tão agradável e diz “O que foi, não gosta mais de cerveja?”
E a garota se inclina sobre o balcão e sussura toda confidencial “Só entre você e eu”, ela sussura “Cerveja faz minha xoxota doer”
A primeira vez que aprendi essa piada, quando meu pai ensinou ela pra mim, eu não sabia o que era “xoxota”. Eu não sabia o que era “batizar” uma bebida. Eu não sabia o que eles queria dizem quando eles falavam sobre “foder”.
Mas eu sabia que esse tipo de conversa fazia meu velhor rir.

Tudo que não disse, nunca

E mesmo longe, irei te encontrar
a paisagem do caos
a passagem do cão
o lobo irá inutilmente uivar
 ADEUS

sábado, 3 de setembro de 2011

Expectativa (Camarada Quimera)

( retirado do blog Complexo de Cassandra )
- Eu perdi minha virgindade pelo ouvido- diz a Camarada Quimera

Ela era tão jovem que ainda acreditava em papai Noel.
A Camarada Quimera esta no palco, com os punhos nos quadris
E os braços dobrados,
Projetando os revestimentos de couro nos cotovelos.
Os coturnos com bico de aço e cadarços estão bem plantados.
As pernas estão cobertas por folgadas calças camufladas,
Amarradas nos tornozelos.
Ela se inclina tanto à frente que seu queixo faz sobre a
Frente do casaco verde-oliva, sobra militar.
No palco em vez de um refletor, um fragmento de filme:
Um documentário com cartazes de protestos e filas de piquetes.
Bocas com formas de megafone
Berram completamente abertas
Só se vêem dentes, nada de lábios
As bocas se abrem tanto que os olhos se fecham com o esforço
A Camarada Quimera diz: – Depois que o juiz concedeu a
Custodia conjunta, minha mãe me disse no meio da noite,
Quando você já adormeceu com a cabeça no travesseiro…
A mãe dela disse: -se um dia seu pai entrar pé ante pé no
Seu quarto, você vem me contar…
Se um dia seu pai tirar a parte debaixo do seu
pijama e apalpar seu corpo…
você vem me contar.
Se ele tirar uma cobra gorda e pesada da barriguilha da calça…
Um cacete quente, pegajoso e fedorento…
E tentar meter na sua boca…
Você vem me contar.
-Em vez de tudo isso, meu pai me levou ao jardim zoológico-
diz a Camarada Quimera.
Ele a levou ao bale. Ele a levou ao treino de futebol
Ele lhe deu um beijo de boa noite.
Com as cores dos grevistas sentados, as formas da
Desobediência civil ainda marchando,
Marchando, marchando,
Sob seu rosto,
Camarada Quimera diz:
-Mas eu passei o resto da vida pronta.

Canto do Cisne ou, simplesmente, O Conto do Jornalista.

Um dia minha cadela come uma quentinha jogada no lixo, e precisa tirar radiografias que custam mil pratas. A área atrás do meu prédio é cheia de lixo e vidro quebrado. No lugar onde as pessoas estacionam os carros, há poças de anticongelante esperando para envenenar qualquer cachorro ou gato.

Mesmo careca, o veterinário lembra um grande amigo meu de infância. Ele é parecido com um garoto que foi criado junto comigo. Tem um sorriso que eu via todo dia quando criança. Uma covinha no queixo e sardas no nariz. Eu conheço todas essas marcas. Sei até que ele usava aquela falha entre os dois dentes da frente para assobiar.

Mas agora ele está junto a uma mesa de aço prateado numa sala fria com azulejos brancos, aplicando uma injeção na minha cadela. Segurando a pele do pescoço do bicho, o veterinário diz algo sobre dilofilária.

Quando encontrei o seu nome no catálogo, eu estava cego de tanto chorar, com medo que minha cadela morresse. Mas ali estava aquele nome: Kenneth Wilcox, doutor em medicina veterinária. Um nome que eu adorei, de alguma forma. Por alguma razão. O meu salvador.

Ele repuxa as orelhas da cadela, examina cada uma, e diz algo sobre a Doença de Carré. No bolso do peito do seu jaleco branco há uma inscrição bordada: “Dr. Ken”.

Até no som da sua voz ecoa uma lembrança muito antiga. Já ouvi essa voz cantando “Parabéns para Você”. Ou então gritando “Fora” numa partida de beisebol.

É ele mesmo, um velho amigo meu, mas alto demais, com as pálpebras flácidas e escurecidas. Tem uma papada embaixo do queixo. Seus dentes estão um pouco amarelados, e os olhos azuis não parecem tão brilhantes quanto deveriam.
– Ela parece estar bem – ele diz.
– Quem? – pergunto.
– Sua cadela – ele responde.
Ainda olhando para ele, vendo a careca e os olhos azuis, eu indago: – Onde você estudou?

Ele diz o nome de uma faculdade da Califórnia. Um lugar que eu não conheço.

Ele era pequeno quando eu era pequeno, e de alguma forma nós crescemos juntos. Ele tinha um cachorro chamado Skip, e passava o verão inteiro descalço, sempre pescando ou construindo uma casa nas árvores. Olhando para ele, consigo visualizar um boneco de neve perfeito, construído durante uma tarde fria, enquanto sua avó observa da janela da cozinha. – Danny? – eu digo.

E ele ri.

Na mesma semana, tento vender uma reportagem sobre ele para um editor. A matéria dirá como eu reencontrei o pequeno Kenny Wilcox, o ator infantil que fazia o papel de Danny no seriado Danny-Next-Door há um zilhão de anos. Danny, o garotinho com que todos nós fomos criados, virou veterinário. Mora num condomínio suburbano, e cuida sozinho do gramado. É ele mesmo, careca e quarentão, um pouco gordo e ignorado.

Esse astro que se apagou está feliz, e mora numa casa de dois quartos. Quando ri, surgem pés-de-galinhas em torno dos seus olhos. Ele toma pírulas para controlar o colesterol. E é o primeiro a admitir que, depois de passar tantos anos como centro das atenções, até se sente um pouco solitário. Mas é feliz.

O importante é que o doutor Ken aceitou ser entrevistado por mim. Um breve perfil para a revista de domingo do jornal.

O editor com quem converso gira a ponta da esferográfica dentro do ouvido, retirando cera. Parece morto de tédio.

Ele diz que os leitores não querem matérias sobre alguém que nasceu bonito e talentoso, ganhou uma fortuna para aparecer na televisão, e depois vive feliz para sempre.

Não, as pessoas não querem finais felizes.

Elas querem saber de Rusty Hamer, o garoto de Make Room for Daddy, que se matou com um tiro. Ou de Trent Lehman,o menino bonito de Nanny and the Professor, que se enforcou numa cerca do parque. Daquela Anissa Jones, que fazia papel de Buffy em Family Affair, agarrada a uma boneca chamada Sra. Beasley, e que engoliu a maior dose de barbitúricos na história do município de Los Angeles.

É isso que as pessoas querem. Pelo mesmo motivo, vamos aos autódromos ver os carros baterem. Como dizem os alemães: “Die reinste Freude ist die Schadenfreude*.” A dor das pessoas que invejamos causa em nós a alegria mais pura. Essa é a mais genuína forma de alegria. A que sentimos quando uma limusine pega a contramão numa rua de mão única.

Ou quando Jay Smith, o “Safadinho” conhecido como Pinky, foi encontrado morto a facadas no deserto perto de Las Vegas.

É o tipo de alegria que sentimos quando Dana Platto, a garotinha de Diff’rent Strokes, foi presa, posou nua para a Playboy e tomou uma overdose de sedativos.

Essas são as manchetes que vendem jornal para as pessoas que ficam na fila do supermercado, tentando aproveitar as promoções e envelhecendo.

A maioria das pessoas quer ler sobre Lani O’Grady, a linda filha em Eight is Enough, encontrada morta com a barriga cheia de Vicodin e Prozac no trêiler onde morava.

Sem bafafá, diz o editor, não tem matéria.

O feliz Kenny Wilcox, com seus pés-de-galinhas risonhos, não é vendável.

O editor me diz: – Se você encontrar pornografia infantil no computador de Wilcox, ou uns cadáveres no porão da casa dele, teremos uma matéria. Ou melhor... descubra que ele tem tudo isso, mas ainda por cima está morto.

Na semana seguinte, minha cadela bebe uma poça de anticongelante. Ela se chama Skip em homenagem ao cachorro que Danny tinha em Danny-Next-Door. Skip, a minha filhota, é branca com grandes manchas pretas, e usa uma coleira vermelha, exatamente como na televisão.

A única cura para o anticongelante é fazer uma lavagem no estômago da cadela. Depois encher a pança dela com carvão ativado. Encontrar uma veia e instilar etanol gota a gota, lavando os rins com álcool puro. Para salvar minha cadela preciso lhe dar um porre de matar. Isso significa outra ida ao doutor Ken. Ele concorda que a semana seguinte será ótima para uma entrevista, mas já previne que sua vida não é muito excitante.

Eu falo que ele pode confiar em mim. Escrever bem significa pegar fatos comuns e dar uma aparência vibrante a tudo. Digo que ele não precisa se preocupar com a história de sua vida: essa é minha função.

Atualmente eu vivo à cata de boas matérias. Venho trabalhando como autônomo há dois anos, desde que parei de fazer matérias de entretenimento. Era um bom dinheiro que eu ganhava só à base de jabás, inventando citações para lançamento de filmes e compartilhando estrelas de cinema com gente da mídia por dez minutos, enquanto todos tentavam não bocejar.

Eram estréias de filmes, distribuições de discos, lançamento de livros: uma corrente incessante de trabalho. Uma única opinião errada, porém, e a mamata acaba. Se um estúdio cinematográfico ameaça cancelar os anúncios programados... abracadabra... desaparece sua assinatura das matérias.

Hoje estou falido, só porque uma vez tentei alertar o público sobre certo filme. Escrevi que seria melhor as pessoas gastarem seu dinheiro em outra coisa, e fui afastado do circuito. Bastou um sucesso de verão e seu poder oculto: hoje eu imploro para escrever obituários, legendas de fotografias ou qualquer outra coisa.

É roubada construir um castelo de cartas que você mesmo não consegue derrubar. Você passa anos sem acumular coisa alguma, apenas criando uma ilusão: transformando um ser humano num astro de cinema. O prêmio verdadeiro está no final do negócio, quando você pode puxar o tapete e derrubar as cartas. Mostrar o galã enfiando um pepino no cú. Revelar a namoradinha do país roubando lojas e se entupindo de analgésicos. Denunciar a deusa espancando filhos com um cabide de arame.

O editor tem razão. Ken Wilcox também. Sua vida dá uma entrevista que ninguém comprará.

Para me preparar, passo a semana toda antes da nossa conversa navegando na internet. Baixo arquivos da antiga União Soviética. Encontro tipos diferentes de astros e estrelas infantis. Estudantes russos ainda sem pelos púbicos fazem boquetes em velhos gordos. Garotas tchecas ainda à espera da primeira menstruação são enrabadas por macacos. Vou salvando todos esses arquivos num CD, fino e compacto.

À noite coloco a coleira em Skip, e arrisco uma longa caminhada pela vizinhança. Quando volto ao apartamento, trago os bolsos cheios de pequenos sacos plásticos, envelopes de papel, e quadrados de alumínio com tabletes de Percodan, OxyContin, e Vicodin. Além de frascos de vidro com crack e heroína.

Escrevo todas as catorze mil palavras da entrevista antes de Ken Wilcox abrir a boca. Antes até de nos encontrarmos.

Para mantermos as aparências, porém, levo meu gravador e um bloco de anotações. Finjo tomar notas com umas canetas velhas. Levo também uma garrafa de vinho tinto “batizada” com Vicodin e Prozac.

Na casinhola suburbana de Ken, eu esperava ver uma cristaleira repleta de troféus empoeirados, fotos reluzentes e medalhas cívicas. Um memorial à sua infância. Não há nada parecido com isso. Qualquer dinheiro que ele tenha ganho está no banco, rendendo juros. A casa tem apenas tapetes marrons e paredes pintadas, com cortinas listradas em cada janela. E um banheiro com azulejos cor-de-rosa.

Eu lhe sirvo vinho tinto e simplesmente deixo que ele fale. De vez em quando peço que faça uma pausa, e finjo que estou anotando cada palavra.

Ele tem razão. Sua vida é mais entediante do que a reprise de um filme de verão em preto e branco.

Por outro lado, a matéria que já escrevi é muito boa. Minha versão sobre a longa queda de Kenny desde o halo dos refletores até a mesa de autópsia. Revela que ele perdeu a inocência com uma ampla lista de executivos da televisão, durante sua campanha para ganhar o papel de Danny. Para manter os patrocinadores felizes, foi cultivado como um brinquedo sexual. Tomava remédios para se manter magro, para retardar a chegada da puberdade e para virar noites gravando cena após cena. Ninguém, nem seus amigos e familiares, sabia que Kenny se viciara completamente em drogas e mantivera uma necessidade perversa de chamar a atenção, mesmo depois do fim da sua carreira. Até a profissão de veterinário era apenas um meio de acesso a drogas boas e sexo com animais pequenos.

Quanto mais vinho Ken Wilcox bebe, mais ele diz que sua vida só começou quando Danny-Next-Door acabou. As oito temporadas vivendo o Danny Bright são tão reais quanto nossas memórias do segundo ano na escola parecem reais. Apenas momentos enevoados sem ligação. Cada fala de diálogo era simplesmente algo que ele aprendia naquele dia só para usar num teste. A linda casa de fazenda da pradaria era apenas uma fachada. Por trás das cortinas de renda nas janelas, só havia terra batida coalhada de guimbas de cigarro. A atriz que representava a avó de Danny cuspia sem parar quando os dois eram focalizados juntos. O cuspe esterilizava: continha mais gim do que saliva.

Bebericando vinho tinto, Ken Wilcox diz que hoje sua vida é muito mais importante. Ele cura animais e salva cães. A cada gole, sua fala vai se esgarçando em palavras isoladas cada vez mais espaçadas. Pouco antes de fechar os olhos, ele pergunta como Skip está.

Minha cadela, Skip.
Eu digo que Skip está bem, muito bem.
E Kenny Wilcoz diz: – Ótimo, fico feliz com isso...
Ele dorme, ainda sorrindo, quando eu meto a arma na sua boca.
“Feliz” não faz bem a ninguém.

A arma não está registrada sob nome algum. Com minha mão esquerda, curvo o dedo dele em torno do gatilho. O pequeno Kenny está despido no sofá, com o pau besuntado de gordura de cozinha, enquanto um vídeo de seu velho programa passa na televisão. Mas o elemento decisivo é a pornografia infantil baixada no disco rígido do computador dele. Além de fotos de crianças sendo fodidas, que foram impressas e coladas nas paredes do quarto.

Os sacos de sedativos estão escondidos embaixo da cama. A heroína e o crack, dentro do açucareiro.

Em menos de um dia, o mundo deixará de amar Kenny Wilcox e passará a ter ódio dele. O pequeno Danny-Next-Door deixará de ser um ídolo infantil e se transformará num monstro.

Na minha versão, Kenny Wilcox passou aquela última noite apontando a arma para todos os lados e lamentando que ninguém mais ligava para ele. Urrava que fora usado e depois rejeitado pelo mundo. Continuou bebendo e engolindo pírulas a noite toda, dizendo que não tinha medo de morrer. Na minha versão, ele morreu depois que eu fui para casa.

Na semana seguinte, eu vendi a matéria: a última entrevista de um astro infantil amado por milhões de pessoas em todo o mundo. Uma entrevista dada poucas horas antes que o vizinho o encontrasse morto, vítima de suicídio.

Uma semana depois, sou indicado para o prêmio Pulitzer.

Poucas semanas depois, ganho o prêmio. São apenas dois mil dólares, mas o lucro real é a longo prazo. Não passa um dia sem que eu recuse trabalho e que meu agente selecione propostas para mim. Não, eu só faço trabalhos com alta visibilidade e muito dinheiro. Matérias de capa para grandes revistas. De âmbito nacional.

Agora meu nome significa Qualidade. Minha assinatura na matéria significa A Verdade.

Meu caderno de endereços está cheio de astros de cinema, roqueiros famosos e escritores populares. Tudo que eu toco, transformo em Famoso. Troco meu apartamento por uma casa com quintal para Skip poder correr, além de jardim, piscina, quadra de tênis e televisão a cabo. Saldamos a dívida de mais de mil pratas que contraímos pelas radiografias e pelo carvão ativado.

É claro, você pode ainda ligar algum canal a cabo e ver Kenneth Wilcox assobiando e atirando bolas de beisebol. Ele era um garotinho assim, antes de se transformar num monstro com gim cuspido na cara. O pequeno Danny e seu cachorro, andando descalços pela pradaria. Seu fantasma televisionado em rede nacional mantém minha carreira viva por contraste. As pessoas adoram saber da minha verdade sobre aquele garotinho que parecia tão feliz.

“Die reinste Freude ist die Schadenfreude.”

Esta semana, minha cadela desenterra e come uma cebola.

Começo a telefonar para vários veterinários, tentando encontrar alguém que salve Skip. A essa altura dinheiro não é problema. Posso pagar qualquer coisa.

Eu e minha cadela somos muito felizes. Levamos uma vida boa. Mas enquanto estou ao telefone, ainda folheando o catálogo, Skip, minha filhota, pára de respirar.

* A frase alemã “Die reinste Freude ist die Schadenfreude” citada no texto significa em português: "A mais pura alegria é a alegria malévola" 

Colocação de Produtos ( Um conto por Cozinheiro Assassino)


Faca


Ao Senhor Kenneth MacArthur
Gerente da Corporate Communications
Kutting-Blok Knife Products, Inc.
Prezado Senhor MacArthut,
Só para esclarecer, vocês fabricam uma faca maravilhosa. Uma faca excelente.
O trabalho numa cozinha profissional já é duro, por si só, para ainda ser feito com facas ruins. Um Allumette de batata perfeito precisa ser mais fino que um lápis. Um corte de cheveu perfeito tem mais ou menos a grossura de um arame, ou seja, metade da grossura de uma batata frita. A gente ganha a vida cortando cenouras à brunoisette com as caçarolas sauté já a espera com manteiga quente, e ouvindo berros que pedem batata à minunette. Quem passa por isso logo aprende a diferença entre uma faca ruim e uma Kutting-Blok.
Eu tenho muitas histórias para contar a vocês. As suas facas vivem salvando o meu rabo.Só quem passa oito horas cortando endívias belgas pode entender o tipo de vida que levo.
Mas é infalível: você passa o dia inteiro esculpindo cenouras pequenas, dando uma forma perfeitamente ovalada a cada uma delas, e a única cenoura que sai malfeita vai parar no prato de um cozinheiro fracassado. Ele é um João-ninguém com diploma de serviços de hospitalidade, um mero pedaço de papel obtido em uma faculdade vagabunda, e agora acha que é um critico gastronômico. É um babaca que mal sabe mastigar e engolir, mas no jornal da semana seguinte ele escreve que o cozinheiro do Chez Restaurant esculpe as cenouras com desleixo.
Uma puta que nenhum banqueiro contrataria, nem para canelar cogumelos, publica na imprensa que minhas pastinacas bâtonnet são grossas demais.
São traíras. Sempre é mais fácil achar defeito no trabalho dos outros que cozinhar as refeições.
Saibam do seguinte: sempre que uma pessoa pede batatas dauphinoise ou carpaccio de carne, alguém da nossa cozinha diz uma pequena oração de graças pelas facas Kuttin-Blok. Seu equilíbrio perfeito. Seu cabo rebitado.
Claro, podem bater na madeira: todos nós gostaríamos de ganhar mais dinheiro com menos trabalho.Mas trair os outros, virar critico, fingir que sabe tudo, dar rasteiras em pessoas que tentam ganhar a vida tirando pele de língua de vitela, aparando gorduras de rins, e arrancando membranas de fígados… enquanto os críticos ficam sentados em seus escritórios limpos, digitando reclamações com belos dedos limpos… isso simplesmente não é direito.
Claro, é só a opinião dele.Mas aparece junto das noticias verdadeiras, como fome, assassinatos em série e terremotos, recebendo o mesmo grau de importância. É alguém reclamando porque a massa que pediu não estava bemal dente. Como se sua opinião fosse um ato de Deus.
Uma garantia negativa. O contrario de um anuncio.
Na minha opinião, quem sabe faz. Quem não sabe, critica.
Isso não é jornalismo. Não tem objetividade. Não é reportagem, é julgamento.
Esses críticos não conseguiriam preparar uma boa refeição nem que suas vidas dependessem disso.
Foi com isso em mente que comecei meu projeto.
Por melhor que você seja, trabalhar numa cozinha é uma morte lenta, ocasionada por um milhão de cortes de faca, dez mil pequenas queimaduras e escaldamentos. Você passa a noite em pé no cimento. Vive andando em cima de chãos gordurosos ou molhados. Sofre lesões no túnel cárpico, danos nervosos resultantes de tanto mexer, cortar e tirar com a colher. Ou de pescar um mar de camarões debaixo do gelo. Tem dores no joelho e veias varicosas, afecções do pulso e do cotovelo por esforço repetitivo. Uma carreira coroada de calamares rellenos equivalentes ao martírio de uma vida toda. Uma vida toda produzindo oossobuco allá milase ideal, equivalente a uma morte lenta por tortura.
Por mais que seu couro seja grosso, porém, não é bom ser retalhado em publico, por alguém que escreve num jornal, ou na Internet.
Esses críticos virtuais estão por ai às dúzias, basta ter uma boca e um computador.
É isso que todos os meus alvos tem em comum. Por sorte os policias não cooperam muito uns com os outros. Talvez notassem um escritor independente em Seatle, um estudante resenhista em Miame, um turista do meio-oeste postando sua opinião numa página de Internet sobre viagens… Todos os meus dezesseis alvos até agora tinham algo em comum. E eu tenho anos de motivação.
Na há diferença entre desossar um coelho e desossar um babaca que escreveu na Internet que a sua constatine al finochcio precisa de mais marsala.
Tudo graças as facas Kutting-Blok. As facas para tourné, forjadas, executam as duas tarefas com perfeição, sem cansar a mão e o pulso como fazem as facas de desossar prensadas, mais baratas.
É como limpar uma aba de carne ou esfolar um pilantra safado que publicou um artigo dizendo que você estragou o filé à Wellington colocando patê de fígado em demasia: As duas facas são rápidas e não requerem esforço, graças à flexível lamina de 20 centímetros da faca de cortar filé de vocês.
Fáceis de limpar e fáceis de amolar. As facas de vocês são uma benção.
Já os alvos, esses acabam me decepcionado, por menor que seja minha expectativa de encontrar essas pessoas.
Só é necessário um simples elogio para marcar um encontro, sugerindo o tipo de parceiro sexual que essa pessoa pode vir a querer. Melhor ainda, você pode sugerir que é editor de uma revista nacional, pensando em dar-lhes visibilidade mundial. Exaltar-lhes a voz. Oferecer-lhes a glória tão merecida. Abrir-lhes a porta da proeminência.
Basta acenar com metade dessa bosta lisonjeira, e esse pessoal irá ao seu encontro em qualquer beco escuro que você indicar.
Pessoalmente, os olhos dessa gente são bastante pequenos. Cada olho parece uma bola de gude negra enfiada no umbigo de um homem gordo. Graças, em parte, as facas Kuting-Blok, o aspecto do pessoal sempre fica melhor quando você limpa,apara e enfeita tudo. É carne, pronta para ser bem usada.
Depois de retiras as viceras frias de cem galinhas-de-angola, não é muito difícil cortar a barriga de um jornalista freelancer que escreveu em algum guia de entretenimento regional que seus folheados de chicória e queijo feta estavam duros demais. Não. Com seus vinte centímetros a faca Kutting-Blok torna essa tarefa tão fácil como limpar um salmão, uma truta ou qualquer peixe redondo.
É esquisito como certas coisas chamam mais a minha atenção. Olhando para o fino tornozelo branco de alguém, eu logo imagino que tipo de garota ela deve ter sido na escola, antes de aprender a ganhar a vida atacando comida. Lembro também de um crítico que usava sapatos marrons, tão reluzentes quanto a cobertura de caramelo de um creme brûlée.
É essa a atenção aos detalhes que vocês põe em cada faca.
Eu costumava por o mesmo cuidado e a mesma atenção no meu trabalho de cozinheiro.
Por mais cuidadoso que eu seja, porém, a policia acabará me pegando. É apenas uma questão de tempo. Pensando nisso, meu único medo é que as facas Kutting-Blok fiquem ligadas, na opinião pública, a uma série de atos que podem ser mal interpretados.
Gente demais enxergará em minha preferência uma espécie de endosso. Como se Jack, o estripador estivesse fazendo um comercial de televisão. Ou Ted Bundy anunciasse uma certa marca de corda.
É realmente um tipo de endosso negativo. Talvez isso até reduza a fatia de mercado e as vendas totais de vocês. Principalmente no varejo, durante a temporada natalina que se avizinha.
Assim que recebem a noticia de um grande desastre com um jato comercial, seja um choque em pleno no ar, um seqüestro, ou uma colisão na pista, os principais jornais sempre suspendem todos os grandes anúncios de companhias aéreas programados para o dia seguinte. Isso acontece celando os anúncios, mesmo que precisem pagar integralmente pelos espaços que não usaram Esses espaços são preenchidos na ultima hora por anúncios gratuitos promovendo a Sociedade Americana do Câncer, ou de Distrofia Muscular. Pois as companhias aéreas não querem se arriscar a ficar associadas com as noticias desastrosas do dia. Não querem ficar ligadas, na opinião publica, há centenas de mortos.
É preciso muito pouco esforço para recordar o que hoje chamamos de assassinatos do Tylenol fizeram ao estoque do remédio. Com sete pessoas mortas, só o recolhimento do produto no ano de 1982 custou à Johnson & Johnson 125 milhões de dólares.
Esse tipo de endosso negativo é o contrário de uma anúncio, é isso que os críticos fazem com suas resenhas venenosas, publicadas apenas para mostrar que se tornaram inteligentes e amargos.
Os detalhes de cada alvo, inclusive as facas usadas, ainda estão todos frescos na minha mente. A policia precisaria de muito pouco esforço para e fazer confessar, anunciando publicamente a ampla variedade das excelentes facas fabricadas por vocês e utilizadas por mim, e com que propósito.
Deste momento em diante,. As pessoas sempre se referirão as “Séries de Assassinatos Kutting-Blok” ou “Matança das Facas Kutting-Blok”. A empresa de você é muito mais conhecida que um pobre anônimo como eu. Vocês já tem uma faca em tantas cozinhas. Seria uma pena ver um nível de excelência do trabalho duro de você, fruto de gerações inteiras, sendo aniquilados pelos meus projetos.
Por favor, considerem que os críticos gastronômicos não compram muitas facas. Podem bater na madeira, mas todo o nosso ramo talvez fique do meu lado nesse caso. Eu, um herói popular. Nunca se sabe.
Qualquer pequeno investimento que vocês possam fazer trará benefícios à ambas partes.
Quanto mais recursos vocês puderem fornecer para que eu não seja capturado, menos provável será que esse fato infeliz venha a ser conhecido pelos fornecedores de facas. Um pequeno brinde de 5 milhões de dólares permitirá que eu imigre e viva sem ser notado em outro país, bem longe do mercado demográfico de vocês. Para a empresa esse dinheiro garantirá uma ascensão constante e um futuro grandioso. Para mim, financiará a reciclagem em outra área de trabalho em uma carreira nova.
Ou então, por apenas 1 milhão de dólares, eu passarei para as facas Sta-Sharp…e se for preso, jurarei que usei o produto de segunda categoria durante todo meu projeto…
Um milhão de dólares, que tal isso em troca de fidelidade à marca?
Para demonstrar que desejam contribuir com meu plano, por favor publiquem um anúncio no jornal local  de vocês no próximo domingo. Ao ver o anuncio, eu entrarei em contato para aceitar sua ajuda. Até então, preciso continuar meu trabalho. Caso contrário, vocês podem esperar outro alvo.
Obrigado por levar em consideração minha solicitação. Aguardo uma resposta de vocês em breve.
Neste mundo em que tão pouca gente dedica sua vida à produzir produtos de qualidade duradoura, envio meus aplausos à empresa.
Como sempre, continuo sendo o maior fã de vocês,
Richard Talbott